Rafael Vieira e José Carlos de Lima Júnior lançam artigo com o tema "O gargalo logístico diante do atraso na comercialização de insumos agrícolas da Safra 23/24". Leia e acompanhe as principais notícias do mundo Agro!
Durante a Safra 22/23, publicamos a primeira série de artigos no portal AgroDistribuidor1 sobre os desafios na distribuição de insumos agropecuários. Nosso objetivo foi dividir com o leitor sobre as principais atividades envolvidas no processo logístico que asseguram o abastecimento dos Centros de Distribuição (CDs), armazéns das Cooperativas e depósito nas Lojas dos Distribuidores e Revendas.
Atividades como gestão dos estoques, capacidade de armazenagem, disponibilidade de frotas de veículos e gerenciamento de riscos foram alguns dos temas analisados, contemplando a relação logística entre a Indústria e a sua rede de Revendas e Cooperativas (sell In) e a posterior conexão entre essas Revendas e Cooperativas com os Produtores Rurais (sell out).
Ao final daquela série, nossa conclusão foi a relevância de manter a eficiência dos processos logísticos entre os diferentes agentes que formam uma cadeia produtiva. No entanto, passado esse tempo, nos encontramos diante de uma nova realidade de mercado com a Safra 23/24.
Ajuste nas cotações dos grãos e cereais, produtores adiando a decisão de compra dos insumos e comercialização de sementes, fertilizantes e defensivos abaixo da média histórica se catalisam, podendo expor o agronegócio brasileiro a um forte gargalo logístico. Por essa razão, três questionamentos nos incentivaram a redigir este novo artigo, que nasce acompanhado de dois vídeos.
(1) Como garantir o abastecimento dos depósitos das Lojas e dos Centros de Distribuição, considerando a dificuldade pela competição de recursos e disponibilidade de caminhões e motoristas durante o período da safra?
(2) Haverá maior exposição a riscos relacionados à capacidade de armazenagem de expedição nos Centros de Distribuição, recebimento nas Cooperativas, Distribuidores e Revendas?
(3) Faltará caminhão para realizar o transporte dos insumos caso ocorra uma concentração dos pedidos de entrega ao Produtor Rural?
Nossa visão: No ambiente de negócios de comercialização de sementes, fertilizantes ou defensivos, a estratégia de postergar a decisão de compra pode sim criar novos gargalos, além dos já existentes na infraestrutura logística do Brasil. Quando os pedidos de uma demanda reprimida são concentrados, há sempre o comprometimento da capacidade de carregamento e expedição em um Centro de Distribuição. Essa situação pode piorar caso não haja equilíbrio com a capacidade de entrega para pedidos de curto prazo, dado que sobrecarrega a disponibilidade de veículos necessários no transporte nessa última milha.
Estudos realizados pela Markestrat, que compilaram diversos números disponíveis no mercado, mostram que as Revendas são responsáveis por 40% das entregas de insumos aos Produtores Rurais. Se incluirmos as Cooperativas, esse volume alcança 70%. Os 30% de volume restante são as transferências conduzidas pelas Indústrias com Acesso Direto, sendo a função de entrega realizada por Operadores Logísticos Especializados.
Especificamente, no caso da Indústria de Defensivos (exemplo), aproximadamente 60% dos volumes de vendas estão posicionados nos Centros de Distribuição Regionais para atender a demanda das Revendas e Cooperativas, enquanto aproximadamente 40% são para atender os clientes de venda direta.
Recentemente, fizemos um levantamento junto aos principais Operadores Logísticos que atuam na armazenagem dos agroquímicos. Até o final da Safra 22/23, havia uma capacidade de armazenagem de 1,3 milhão de posições pallets, em 52 Centros de Distribuição Regional, distribuídos 50% no Cerrado e 50% na região Sul do Brasil. Quando adicionamos a capacidade existente dos Distribuidores (Revendas e Cooperativas), essa estimativa ultrapassa 2 milhões de capacidade de armazenagem em posições pallets. O detalhe é que quando convertemos em Quilo/Litro (Kg/L), a nossa capacidade total de armazenagem se mostra inferior ao consumo.
Por essa razão, a maioria das Indústrias terceiriza as operações logísticas com empresas especializadas, uma vez que há nesses operadores infraestrutura e conhecimento em gestão de riscos necessários para lidar com os intervalos de intensa concentração de pedidos (alta demanda). A adoção de sistemas de gestão dos estoques, rastreamento dos produtos e roteirização nas entregas são algumas das atividades coordenadas que otimizam as operações logísticas e minimizam os gargalos e os desafios conhecidos dos profissionais responsáveis pela distribuição dos insumos. No entanto, é importante salientar que, mesmo de posse desses valiosos recursos, haverá sempre alguma eventualidade ou limitação. Por isso é necessário que todo agente que faz parte de uma cadeia produtiva saiba que há custos adicionais de ineficiência de inúmeras naturezas, sendo fundamental considerá-las. Essa é a razão para aprofundarmos sempre no histórico da empresa e na capacitação de todos da equipe.
Atualmente, a Indústria, Distribuição e Operadores Logísticos têm adotado diversas estratégias para superar esses gargalos logísticos. A mais comum é antecipar o próprio movimento às datas de alta demanda. E mesmo assim, o histórico dos nossos projetos evidenciam que são medidas paliativas, caso não estejam alinhadas com base em previsões precisas de venda, capacidade de produção e recursos logísticos.
Aumentar a capacidade logística, investir em frota de veículos, ampliar ou construir Armazéns e Centros de Distribuição, adotar Tecnologias da Informação e adotar modelos mais eficientes de previsão e gerenciamento são algumas decisões que fazem parte da rotina das equipes que planejam e executam as operações do setor.
Fato é que se mostra urgente, e mais do que necessário, todas as empresas do agro adotarem estratégias internas à realidade que o momento nos impõe. Seja para equilibrar a capacidade de armazenagem, carregamento e expedição instalada, em razão de se evitar transtornos irreversíveis e que possam comprometer as entregas dos insumos nas propriedades rurais. Além, é claro, da elevação dos próprios custos operacionais e da corrosão da margem, que já se encontra bastante deteriorada.
Nossa orientação é que, nesse momento, precisamos avançar no fechamento das compras de insumos, uma vez que apesar da capacidade instalada da rede ser aparentemente grande, esta não suportaria uma concentração de pedidos.
Inclusive, destacamos que a pressão de alta nos fretes já indica uma provável concentração de demanda para os próximos dois meses. Se a inflação no frete implica no aumento do custo operacional, por outro lado há o risco de se perder a janela adequada para o preparo do solo, semeadura ou mesmo a aplicação dos defensivos. Sob a perspectiva do produtor, não receber o produto adequado que proteja a sua lavoura, é arriscar a produtividade e a rentabilidade de toda operação agrícola, tornando-se, ainda mais desafiador, dado o contexto de clima desfavorável que se configura, em diversas regiões do país.
Combinadas, essas duas situações poderiam comprometer o Calendário Agrícola da Safra 23/24, especialmente na cultura do milho de 2ª safra.
Conclusão. Os gargalos logísticos com a alta concentração da demanda representam sim um sério desafio às Indústrias, Revendas, Cooperativas e Produtores Rurais. A boa notícia é que é possível minimizar esse gargalo logístico combinando, de maneira inteligente, o entendimento no fluxo das mercadorias nas redes de suprimentos e distribuição, com um planejamento temporal, estruturado, internamente, em processos e equipes alinhadas, e, externamente, em parcerias sólidas com prestadores de serviços logísticos.
Nesses últimos meses do ano, igualmente o atendimento será exigido. Por essa razão, ideal é manter atenção especial com a “logística dos repiques”, principalmente em função de necessidades pontuais de replantio ou aplicação de reforço em defensivos. Nos dois casos, a disponibilidade do produto, independente se na Revenda, Distribuição ou Cooperativa, aliada à coordenação ágil entre a equipe do canal e a indústria, com foco na solução de suprir essas demandas, precisa ser rápida. A justificativa é que logística de repiques, quando conduzidas corretamente, minimizam eventuais prejuízos que poderiam comprometer o manejo adequado da lavoura.
Um dos pilares da eficiência estratégica é a comunicação. Na relação de sell out, manter a comunicação aberta com os produtores, informando-os sobre possíveis atrasos ou restrições na entrega, em períodos de alta demanda, é fundamental, pois administra expectativas e evita insatisfações. Na relação de sell in, no caso com o Distribuidor, há um drama adicional, dado que a alta disponibilidade do produto em estoque não conflita com a necessidade de recebimento e expedição para entregar o faturamento. Nesse caso, o alinhamento logístico colaborativo entre a Distribuição e a Indústria será um ponto essencial na execução e entrega aos produtores.
Na operação logística, a estratégia mais eficiente depende da visão sistêmica entre a empresa e como ela “sente” os desafios do momento. Afinal, o objetivo final sempre é garantir a satisfação do cliente, com o menor custo possível. Por essa razão é que recomendamos que a área logística esteja sempre alinhada com a área comercial na condução dos negócios.