Aspectos Estratégicos e Diferenças das Revendas Agrícolas e Lojas Agropecuárias - Parte 1

Matheus Consoli e Matheus Marino destacam os fatores pelos quais acreditam na convergência entre revendas agrícolas e lojas agropecuárias. Eles justificam essa aproximação principalmente pelo potencial de integração entre agricultura e pecuária.

Interessantemente, a Markestrat iniciou trabalhos e pesquisas na área de insumos com projetos relacionados a “revendas” agropecuárias, com estudos relacionados à distribuição de produtos de nutrição animal, saúde animal e acessórios. Com o tempo, passamos a atuar com empresas de insumos agrícolas, principalmente defensivos, sementes e fertilizantes, e mais recentemente nutrição vegetal, biológicos e alguns serviços.
Com o tempo, fomos entendendo que tanto para os fornecedores de insumos quanto para os empresários da distribuição, as revendas agrícolas e lojas agropecuárias são negócios diferentes, com estratégia, estrutura e forma de acesso a mercado peculiares, salvo algumas exceções. Em alguns projetos e estudos recentes, chegamos a avaliar se esses canais iriam convergir, considerando o potencial de integração entre agricultura e pecuária.
Algumas empresas de insumos e mesmo revendas nos questionam sobre isso. Nossa opinião é que sim! Acreditamos em uma convergência, mas isso deve demorar um pouco. Destacaremos alguns motivos nesse artigo e em um próximo. De qualquer maneira, isso já acontece, principalmente nas lojas de cooperativas e algumas revendas focadas no negócio de pecuária e agricultura.
Mas por que essa integração de canais não deve ser rápida? Nossos levantamentos, pesquisas e entrevistas indicam alguns pontos centrais:
• O pecuarista “pensa” diferente do agricultor.
Pensando no cliente de uma revenda, dado que alguns produtores possuem lavora e pecuária, não seria melhor comprar “tudo” em um lugar só, indagam algumas empresas. A lógica simplista diz que sim, mas quando considerados os processos de compra, critérios de decisão de compra, estrutura e ciclo das atividades, sistema de comercialização e relevância dos insumos no custo de produção, a agricultura divergem consideravelmente da pecuária.
A análise mostra também que a atividade agrícola está mais avançada em termos de profissionalização de processos, gestão e adoção de tecnologia, o que dificulta a curto prazo a integração dos modelos de negócio de cada uma dessas atividades. Pode ser uma oportunidade para revendas e fornecedores. Algumas regiões podem ser mais “rápidas” nesse processo, mas não acreditamos em uma convergência a curto e médio prazo.
Por natureza da atividade, o pecuarista planeja superficialmente a aquisição de insumos que se dá em função da necessidade da atividade, ou seja, no dia a dia. O planejamento anual de compras permitirá ao pecuarista a redução e o gerenciamento de seu custo de produção, o que permitirá a sobrevivência em um cenário mais competitivo.
• Grau de pulverização e relevância de mercado dos canais.
As revendas agrícolas representam um potencial de mercado (valor dos produtos – Ex.: fertilizantes, defensivos e sementes) consideravelmente maior do que os dos produtos de pecuária (Ex.: nutrição e saúde animal). Em termos robustos, a distribuição de insumos agrícolas é realizada por cerca de 6.000 grupos empresariais, sendo que cerca de 600 (revendas e cooperativas) representam algo próximo a 70% do mercado indireto segundo levantamento Markestrat.
Já a distribuição de insumos pecuários tem cerca de 20.000 pontos de vendas no Brasil, com elevado grau de pulverização. A existência de inúmeros pontos de vendas de insumos veterinários no Brasil é explicada pela baixa concentração da produção pecuária, ou seja, presença de muitos pecuaristas. A constante busca por competitividade tende a promover a concentração no setor de produção animal, com destaque para o segmentos de ruminantes.
O processo de exclusão dos menos competitivos, tradicionalmente os menores, pode durar anos. Em um cenário mais concentrado na pecuária, a consequência é a redução dos pontos de vendas de insumos veterinários.
• Grau de exclusividade e relevância para fornecedores.
No mercado de insumos agrícolas, existe um certo grau de “Exclusividade” e fidelidade da revenda com fornecedores preferenciais.Já na distribuição de insumos pecuários, a, integração e interdependência entre canais e seus fornecedores é bem mais reduzida. Como consequência dessa estrutura de mercado (que tem fatores históricos e estruturantes), os fornecedores tem apoiado e investido muito mais na relação com revendas agrícolas (dado que o grau de exclusividade justifica esse investimento) do que acontece no mercado pecuário.
Como consequência, as revendas agrícolas evoluíram em qualificação, estrutura de gestão e cobertura de mercado e estão estruturalmente mais preparadas para movimentos estratégicos quando comprados com as revendas e lojas agropecuárias. A venda de valor, e consequente garantia de rentabilidade, carece de ações conjuntas entre distribuidores e fabricantes. O movimento dos líderes da indústria de insumos veterinários sinaliza a estruturação de políticas de distribuição que beneficia os distribuidores parceiros que “vestem a camisa” do fabricante e que possuam gestão desenvolvida.
• Demanda de serviços e apoio do fornecedor.
Relacionada com o tema anterior, as revendas agrícolas foram “acostumadas” com elevada influência, suporte (gestão, sistema, processos, capacitação etc) dos fornecedores. Também é comum no mercado, a existência de sistemas avançados de relacionamento por meio de rebates e integração de dados, o que viabiliza a forte interação entre distribuidores e fornecedores (apesar de que outros movimentos não abordados nesse artigo tentem a fazer movimentos contrários a essa integração e exclusividade).
Já as revendas agropecuárias, por serem individualmente menos relevantes para o negócio total de um fornecedor em específico, não tiveram a “sorte” de receberem suporte e incentivo a estruturação e crescimento, o que por sua vez, não justificou a fidelidade a um fornecedor. Os distribuidores estão tradicionalmente presentes no modelo de distribuição de insumos veterinários, ou seja, o fabricante comercializa sua produção com grandes distribuidores que se relacionam com as revendas. As atividades de apoio e desenvolvimento das revendas ficam a cargo do distribuidor.
A concentração da pecuária e por consequência dos pontos de vendas pode “dificultar a vida do distribuidor” e permitir o acesso direto do fabricante as revendas. Vale ressaltar também, que as exigências legais e a complexidade do negócio exigiram avanços maiores na distribuição agrícola, quando comparada com a pecuária. Assim, discutimos nesse primeiro artigo alguns pontos que destacam as diferenças estratégicas entre as empresas envolvidas na distribuição de insumos para agricultura e pecuária. Esperamos contribuir para sua análise, avaliação e melhorias na estratégia dos se negócio.
Ótimo trabalho a todos!
* Os autores são sócios e consultores da Markestrat Uni.Business, atuam em projetos em agronegócios e distribuição de insumos agropecuários. Para informações visite www.markestrat.org
Matheus Alberto Consoli - Especialista em Estratégias de Negócios, Gestão de Cadeias de Suprimentos, Distribuição e Marketing, Vendas e Avaliação de Investimentos. Doutor pela EESC/USP. Mestre em Administração pela FEA/USP. Administrador de Empresas pela FEA-RP/USP. Professor de MBA??s na FUNDACE, FIA, FAAP, PECEGE/ESALQ, entre outros.

* Matheus Kfouri Marino - Especialista em gestão de revendas e cooperativas agroindustriais. Doutor em Administração pela FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo) em 2005. Mestre em Engenharia de Produção pela UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) em 2001. Engenheiro Agrônomo na FCAVJ-UNESP. Foi pesquisador e professor do PENSA (Centro de Conhecimento em Agronegócios) de 1997 a 2008. Foi professor nos MBAs da FIA e FUNDACE. Atualmente é professor da FGV-EESP (Escola de Economia de São Paulo) e coordenador acadêmico dos MBAs em agronegócios da FGV. Fundador da Uni.Business Estratégia em 2004.